domingo, 20 de março de 2011

A Cultura: indispensável ou pecado?

Parafraseando Edward Burnett Tylor, cultura é: 

"...aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade."

Dito de outra forma, cultura constitui tudo aquilo que o Homem institui na natureza, formando uma identidade própria, característica de determinada zona geográfica e de uma dada população; não há homem sem cultura, mas cada sociedade possui as suas normas culturais específicas e particulares. É a concretização deste conceito que nos “transforma” no que nós somos fenotipicamente.

Representação da cidade de Nova Iorque.
São visíveis múltiplos elementos culturais em voga na nossa actualidade
 
"Family Portrait" autor desconhecido
À nascença, somos integrados numa família que desde cedo nos incute valores e normas, para que a sociedade nos aceite, seres repugnantes e alheios  à Cultura envolvente. Esta é, assim, a nossa primeira fase de socialização, a integração familiar. Com ela aprendemos o “saber estar” num grupo, aprendemos a camuflar as nossas pulsões biológicas, amenizando-as.

Após esta fase estar concluída, o ser animal, biológico nascido, torna-se um ser aparentemente dócil que consegue dissimular os seus desejos mais intrínsecos, graças à “preciosa” ajuda familiar, tendo em vista a aceitação deste novo ser na sociedade. Esta mutação é feita segundo uma regra comum, os valores culturais em vigor. É a preparação para a fase adulta, o tudo-nada que condicionará todas as nossas acções na fase adulta. Se a Socialização Primária for concluída com sucesso, isto é, de acordo com o padronizado pela sociedade, o individuo está apto para passar ao nível seguinte.

Seguidamente, principia a fase seguinte de socialização, a fase secundária. Neste caso temos um individuo no estado adulto e a apreensão de novos saberes advém da intensidade da socialização e está ligada à integração plena na vida social activa e aos ajustamentos decorrentes de alterações nos estatutos e funções sociais. Nesta fase, o individuo está completo ao nível da sua personalidade e as suas aspirações acompanhá-lo-ão o resto da sua vida.


 Por vezes, nesta odisseia cultural, a maturação do individuo bem como as suas aspirações e desejos são confundidos com os ideais da Sociedade, fruto da cultura que se vivencia no momento efémero do individuo. O Ser que se lança ao mundo vem imbuído de ideias sobre aquilo que quer ser, e muitas vezes esquece-se das suas limitações.

A nossa sociedade é um óptimo exemplo para a minha tese: há 25 anos atrás, perguntava-se a uma criança sobre o que ela queria ser no futuro e obtínhamos respostas como “Veterinário”, “Médico”, “Advogado”, “Professor”; nos dias de hoje pergunta-se a uma criança o que ela quer ser no futuro e somos confrontados com “Futebolista”, “Modelo”, “Cantora”, etc. Ao que se deverá tudo isto? 

Como já foi referido acima, a Cultura é uma característica de determinada zona geográfica e de uma dada população, e por conseguinte, não é permanente, altera-se ao longo da evolução histórica. Essa evolução cultural influencia toda a Socialização, que por sua vez influencia o individuo, desviando-o das suas verdadeiras pretensões, camuflando-as com outras. O resultado é uma pessoa que seguiu determinada carreira, é aparentemente sucedida, mas ainda assim incompleto, frustrado. Estes casos estão em voga nos nossos dias: muitos filhos seguem copiosamente os desejos dos seus pais, pondo de parte os seus próprios desejos; há ainda o caso dos indivíduos que vivem numa família “desajustada” socialmente ou alienada, neste caso o individuo segue aquilo que vê na “realidade mais próxima do real”, aquilo que a comunicação social lhe transmite: as telenovelas, as vidas cor-de-rosa dos famosos…

O resultado é uma pessoa frustrada, desajustada ao nível social, desequilibrada, com problemas em discernir o seu estatuto social (e consequentemente o seu papel).

"O Filho do Homem" - René Magritte

Posto isto, levanta-se a questão: onde está a falha? Parece-me lógico que a falha está na socialização primária, a família como agente educativo/normativo falha redondamente, não gerando um ser adaptado ao meio social agreste, mas sim um alienado perfeitamente integrado numa sociedade com uma cultura dita, etnocentricamente, evoluída(?)…


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