Parafraseando Edward Burnett Tylor, cultura é:
"...aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade."
Dito de outra forma, cultura constitui tudo aquilo que o Homem institui na natureza, formando uma identidade própria, característica de determinada zona geográfica e de uma dada população; não há homem sem cultura, mas cada sociedade possui as suas normas culturais específicas e particulares. É a concretização deste conceito que nos “transforma” no que nós somos fenotipicamente.
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Representação da cidade de Nova Iorque.
São visíveis múltiplos elementos culturais em voga na nossa actualidade |
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"Family Portrait" autor desconhecido |
À nascença, somos integrados numa família que desde cedo nos incute valores e normas, para que a sociedade nos aceite, seres repugnantes e alheios à Cultura envolvente. Esta é, assim, a nossa primeira fase de socialização, a integração familiar. Com ela aprendemos o “saber estar” num grupo, aprendemos a camuflar as nossas pulsões biológicas, amenizando-as.
Após esta fase estar concluída, o ser animal, biológico nascido, torna-se um ser aparentemente dócil que consegue dissimular os seus desejos mais intrínsecos, graças à “preciosa” ajuda familiar, tendo em vista a aceitação deste novo ser na sociedade. Esta mutação é feita segundo uma regra comum, os valores culturais em vigor. É a preparação para a fase adulta, o tudo-nada que condicionará todas as nossas acções na fase adulta. Se a Socialização Primária for concluída com sucesso, isto é, de acordo com o padronizado pela sociedade, o individuo está apto para passar ao nível seguinte.
Seguidamente, principia a fase seguinte de socialização, a fase secundária. Neste caso temos um individuo no estado adulto e a apreensão de novos saberes advém da intensidade da socialização e está ligada à integração plena na vida social activa e aos ajustamentos decorrentes de alterações nos estatutos e funções sociais. Nesta fase, o individuo está completo ao nível da sua personalidade e as suas aspirações acompanhá-lo-ão o resto da sua vida.
Por vezes, nesta odisseia cultural, a maturação do individuo bem como as suas aspirações e desejos são confundidos com os ideais da Sociedade, fruto da cultura que se vivencia no momento efémero do individuo. O Ser que se lança ao mundo vem imbuído de ideias sobre aquilo que quer ser, e muitas vezes esquece-se das suas limitações.
A nossa sociedade é um óptimo exemplo para a minha tese: há 25 anos atrás, perguntava-se a uma criança sobre o que ela queria ser no futuro e obtínhamos respostas como “Veterinário”, “Médico”, “Advogado”, “Professor”; nos dias de hoje pergunta-se a uma criança o que ela quer ser no futuro e somos confrontados com “Futebolista”, “Modelo”, “Cantora”, etc. Ao que se deverá tudo isto?
Como já foi referido acima, a Cultura é uma característica de determinada zona geográfica e de uma dada população, e por conseguinte, não é permanente, altera-se ao longo da evolução histórica. Essa evolução cultural influencia toda a Socialização, que por sua vez influencia o individuo, desviando-o das suas verdadeiras pretensões, camuflando-as com outras. O resultado é uma pessoa que seguiu determinada carreira, é aparentemente sucedida, mas ainda assim incompleto, frustrado. Estes casos estão em voga nos nossos dias: muitos filhos seguem copiosamente os desejos dos seus pais, pondo de parte os seus próprios desejos; há ainda o caso dos indivíduos que vivem numa família “desajustada” socialmente ou alienada, neste caso o individuo segue aquilo que vê na “realidade mais próxima do real”, aquilo que a comunicação social lhe transmite: as telenovelas, as vidas cor-de-rosa dos famosos…
O resultado é uma pessoa frustrada, desajustada ao nível social, desequilibrada, com problemas em discernir o seu estatuto social (e consequentemente o seu papel).
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"O Filho do Homem" - René Magritte |
Posto isto, levanta-se a questão: onde está a falha? Parece-me lógico que a falha está na socialização primária, a família como agente educativo/normativo falha redondamente, não gerando um ser adaptado ao meio social agreste, mas sim um alienado perfeitamente integrado numa sociedade com uma cultura dita, etnocentricamente, evoluída(?)…